quinta-feira, 6 de março de 2008

Dança

Despeço-me, para voltar mais uma vez ao teu suplício, à vontade que tenho de te conseguir, de fazer vencer, como sempre, os passos que cruzaste no tempo, entre homens e mulheres que te seguiam, sem saberem. És como mãe, invisível nos desafios que propões: generosas são as mãos que me levantam alto e me devolvem à terra, para que o seu cheiro e a sua dor ganhe sentido, em mim.
A dor da terra é tremenda, quando pisada depois de um Salto. Assalto à memória, à saudade de subir ao ramo mais alto e dizer-me lua, ou flôr pequena, que queda leve sem sentir. Que bom que era! Amassar o chão frio de pele crua, sem arrepios de medo.
Agora, de pés receosos, mais sábios que outrora, o atrito encarece o movimento.
Esse atrito, que se acumula ao canto da boca e reserva a trama das palavras secretas, que sedimenta o coração com camadas rugosas de desarmadas paixões e, no final, desmascarado nos beija, para que tentemos mais uma vez, o salto mais alto. Aquele que nos amadurece, que traça o movimento das correntes e remove o fundo do mar. Ser o atrito do chão, da gente, da vida que nos invade, e poder dançar, um dia, todos os dias, a canção do Nosso Berço.
Mãe cambiante, de vento enternecido, tomas a imagem das pernas e dos braços, o corpo com alma querido por mim.
(Catarina Morato)

Nenhum comentário: