quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Janelas Para a Alma: Mandalas


Símbolos do psiquismo humano, as mandalas têm o poder de nos levar à introspecção e nos colocar em contato com os níveis mais profundos da nossa consciência.

Texto: Paulo Urban/Ilustrações: Mônica Facó- Todas as ilustrações deste artigo, com exceção da abertura (de Rogério Borges), são de Mônica Facó, que trabalha com artesanato gráfico, mandalas e cartões; e-mail: monicaf@.... Paulo Urban é médico psiquiatra, acupunturista e terapeuta junguiano; e-mail: paulourban@....


Mandala é um termo sânscrito, que se traduz por círculo mágico. Mas, na tradição hindu, seu conceito expressa muito mais do que as palavras que possam defini-lo. O dicionário de Aurélio Buarque de Holanda aceita o termo, registra-o como substantivo feminino e o explica como imagem do mundo e instrumento para a meditação. Em seu estado original a palavra é oxítona de gênero masculino, pronunciada abertamente: man-da-lá. Não somente designa um mantra, mas o vivifica por ser ela própria o movimento.

Mantras são sons vocálicos, puros ou combinados, passados dos mestres aos discípulos. Costumam ser verbalizações secretas de poder, transmitidas como fórmulas rituais particulares, usadas para fins iniciáticos; mas há mantras de domínio geral, aplicados à coletividade, especialmente devotados ao despertar psíquico, ou proferidos em prol da paz ou saúde do planeta.

Quando escritos, os mantras assumem a forma de seu equivalente gráfico, os iantras, figurações que tendem à simetria geométrica e se comportam também como raízes gráficas (chamadas mula-iantras) dos diferentes mantras e demais termos que deles se derivam. Os iantras nada mais são que o suporte, o arcabouço linear dos mantras. Mas estão muito além do conjunto correlato de letras que se combinam para criar vocábulos nos idiomas ocidentais, já que o hinduísmo considera que as palavras têm vida, que toda vogal é extensão das notas musicais da voz divina. Os mantras, portanto, são a alma dos iantras, o espírito por detrás da matéria que o Verbo cria e denomina.

Representações mandálicas são sublimes; suas formas representam a combinação perfeita entre os mantras e seus respectivos iantras. No tantrismo, prestam-se à meditação; comumente as vemos pintadas ou riscadas no chão, feitas de sementes ou grãos de areia, usadas para delimitar locais sagrados, como o altar dos templos, ou áreas destinadas a procedimentos ritualísticos específicos.

Assim como o fogo, as mandalas têm ainda a propriedade de nos prender a atenção, de nos convidar à introspecção, à percepção de seus aspectos, de seu arranjo harmônico, que se distribui num quatérnio espacial.

Tal como a água, deleitam-nos a ponto de nos fazer tranqüilos; propiciam à mente que se distancie dos problemas imediatos, induzindo-a ao exercício da contemplação. Efeito semelhante ocorre quando observamos peixes num aquário em seu vaivém constante, em sua dança circular que nos acalma. Mandalas são, portanto, todas as formas que nos permitem penetrar no jogo das vibrações que constituem o universo. São portas quânticas para outros níveis de consciência, verdadeiras bases de lançamento de nossas naves Enterprises, no seio das quais viajamos a lugares onde nenhum homem jamais esteve.

As mandalas selam o sacramento de nossa união com o cosmos. São veículos para o religamento de nossa consciência com a fonte absoluta de onde provimos. Na tradição tibetana, são guias imaginários e provisórios da alma; orientam-nos em nossa prática meditativa e transmitem o equilíbrio com que se distribui a essência divina, cuja ubiqüidade jamais permite que a capturemos em nossas mãos. Concordante é o pensamento do filósofo medieval Nicolau de Cusa (1400-1464): “Deus é uma esfera cujo centro está por toda parte, embora suas circunferências não O delimitem em parte alguma.”

Do círculo divino, forma absoluta, fechada em si, emana o quadrado, o quarto dos símbolos primordiais.

O círculo é o terceiro dos quatro símbolos fundamentais. Comecemos pelo ponto, virtualidade sem a qual o mundo inteiro não estaria manifesto; de sua natureza se estende a cruz, segundo elemento, que, ao girar sobre si mesma, produz o círculo. Este, por ser perfeito, sem começo, meio ou fim, diz respeito ao mundo divino, ou à imagem de Deus quando quer que O representemos pelo oroboro (a cobra que morde o próprio rabo), a simbolizar a vida que, perenemente, se devora e se transforma. Do círculo divino, forma absoluta, fechada em si, emana o quadrado, o quarto dos símbolos primordiais, representando a Terra e todas as criaturas.

Ancorado sobre seus quatro lados, o quadrado tende à estabilidade, contrastando com o dinamismo da roda ou do círculo, que é puro movimento. Em oposição ao céu, o quadrado designa o plano terreno em que se manifestam todas as coisas criadas. Altares e templos comumente são quadrangulares ou retangulares; sob essas formas também se organizavam as cidades antigas, bem como as fortalezas e os acampamentos militares. No campo das religiões, observemos a Caaba, de Meca, templo máximo do islamismo. A pedra cúbica significa a divindade dando fundamento a toda a humanidade, ao mesmo tempo em que sustenta, feito pilar supremo, a abóbada celeste, outra representação da morada de Deus. Ademais, em época anterior ao Islã, Meca era chamada por Umm-al-Qura, ou “Mãe das Cidades” (Corão, 6, 92 e 42,5), sendo considerada, tal qual o templo apolíneo de Delfos, o Umbigo do Mundo.

Em outros casos, é o círculo que delimita lugares consagrados ao divino, como, por exemplo, o enigmático templo rochoso de Stonehenge, construído, entre 2600 e 1700 a.C., a partir de conhecimentos astronômicos de espantosa precisão. Curiosamente, a palavra inglesa usada para designar igreja, church, provém do escocês antigo kirk, que, além de templo, significa círculo.

Na verdade, toda forma circular, quadrangular ou qualquer outra que insinue a presença de um centro em torno do qual todo um complexo se organiza pode ser tida como uma forma mandálica. Não foge à regra a Távola do Rei Arthur, circular e orientada em torno do Graal, símbolo do ideal comum de integração e transcendência.

Mandalas podem ser consideradas sagradas por tudo isso. Ao sintetizarem os conceitos de mantra e iantra em todas as suas possíveis combinações, revelam, por imagens que nunca se repetem, a infinita variedade do potencial divino. Quando quer que meditemos incursos na harmonia de seus desenhos, mais prontamente nos alçamos em espiral, projetando-nos em torno do rabo da serpente e nas asas da espiritualidade.

A tradição alquímica propõe que os filósofos, mediante a pedra filosofal, ou por meio do elixir da longa vida, atinjam o fulcro do derradeiro mistério oculto na quadratura do círculo. Metaforicamente, “quadrar” o círculo é fazer caber no plano humano (o quadrado) toda a dimensão divina (o círculo).

Muito antes de os alquimistas medievais terem nascido, os pitagóricos (século 6 a.C.), herdeiros dos ritos órficos, viam na tetrakys, ou tétrade sagrada, a base de sua doutrina, que faz do 10 um número perfeito, resulta- do da soma do quatérnio básico (1+2+3+4=10), do qual emana toda e qualquer forma vivente. “O Universo é número”, dizia Pitágoras, que valorizava o 4 como alicerce da vida, e o 3 como a própria divindade. De seu produto (3x4) obtinha-se o número que revelava a totalidade do acerto entre homens e deuses: 12 é o número do todo.

Carl Gustav Jung viu nas mandalas o melhor dos exemplos figurativos daquilo que ocorre em toda a dinâmica psíquica, cuja essência última resta sempre incapturável. Inspirado na máxima citada de Nicolau de Cusa, Jung chamou de selbst o centro organizador da psique, espécie de núcleo atômico psíquico. Traduzido para o inglês por self, o termo encontra em português expressão que muito melhor o representa, o si mesmo. A rigor, na psicologia junguiana, tal instância é o ponto central de todo o psiquismo, mas também sua esfera inteira, que abrange o mundo inconsciente bem como o consciente. O ego aqui é mero centro funcional de nossa consciência, a mesma que nos permite dar conta de nossa individualidade.

As mandalas revelam, por imagens que nunca se repetem,
a infinita variedade do potencial divino.

Como todo arquétipo, o si mesmo é essencialmente incognoscível. Dele sabemos apenas empiricamente e por vias indiretas. São nossos sonhos que nos contam de sua existência; o percebemos, nos mitos e contos de fada, sempre disfarçado por detrás dos símbolos da totalidade, como o círculo, a cruz e o quadrado; ou por meio de contrastes que expressem a coniunctio opositorum, isto é, a união dos opostos que também se complementam, como é o caso do dia e da noite, do bem e do mal, de yin e yang.
Às vezes, o si mesmo se esconde por detrás de personagens que dinamicamente se encarregam de desenvolver toda uma trama dialética, como ocorre com as duplas Fausto e Mefistófeles, Dom Quixote e Sancho Pança, Peter Pan e o Capitão Gancho, etc. Em outras ocasiões, ele está no personagem axial desses enredos mágicos, quer na figura de um rei, de um profeta, ou projetado sobre um avatar ou mesmo num herói qualquer que, enredado em sua missão lendária, busca vencer obstáculos intransponíveis pelos seres comuns, mediante o que ele reorganiza e salva o mundo onde vive seu drama.

Através dos séculos, a humanidade sempre se mostrou mais ou menos consciente acerca da existência do si mesmo. Entre os egípcios há o conceito Ba como instância além da alma comum, correspondente ao daimon dos gregos, aspecto que Sócrates admitia aconselhá-lo sempre, em suas horas mais difíceis. Em sociedades e culturas primitivas, a idéia está incutida ora num espírito protetor da natureza, ora sobre a imagem de algum animal, ou num sábio antepassado cuja função, depois de morto, é a de orientar sua tribo.

Jung viu nas mandalas o melhor dos exemplos figurativos daquilo que ocorre em toda a dinâmica psíquica.

Segundo Jung
, há duas razões principais pelas quais podemos perder contato com o si mesmo que nos regula e nos tempera, o que compromete a distribuição homogênea e espontânea da energia anímica por toda a mandala de um psiquismo saudável.

O primeiro obstáculo surge sempre que nos vemos tomados por impulsos instintivos emocionalmente fortes, que nos levam a reagir visceralmente. Até os animais comportam-se assim, quando, por exemplo, excitados sexualmente, esquecem-se até da fome, ou descuidam-se de suas defesas, em detrimento da conduta habitualmente tomada para sua segurança. São inúmeros os povos indígenas em que situações de perturbação mental, associadas ou não às doenças físicas, são interpretadas pelos xamãs como um quadro de “perda da alma” – nada mais, segundo a psicologia analítica, do que o resultado da unilateralidade do funcionamento psíquico, capaz de condensar demasiada energia em torno deste ou daquele aspecto num processo neurótico e gerador de complexos.

A humanidade sempre se mostrou mais ou menos consciente acerca da existência do si mesmo.

O segundo empecilho é propriamente uma condição oposta à primeira; advém da cristalização excessiva do ego, que adora se prender ao mundo da realidade objetiva e esquecer-se de todo o resto, dificultando a percepção dos estímulos inconscientes provenientes do centro psíquico interior. Claro, precisamos de um ego conscientemente voltado às tarefas habituais da vida. Mas ele deve ser bem disciplinado e nos levar às realizações pessoais sem cair no abismo de julgar que só a realidade objetiva possa locupletar as necessidades da alma. Por essa razão, muitas vezes acordamos ungidos pela bênção de certos sonhos significativos, cuja função é a de restaurar a receptividade cotidianamente perdida e restabelecer o diálogo necessário entre a consciência e o mundo psíquico mais profundo. Sempre que nos privamos prolongadamente desse intercâmbio entre o ego e o si mesmo, ainda que não o percebamos, adoecemos; e o surgimento de sintomas neuróticos ou psicóticos, mesmo doenças orgânicas das mais simples às incuráveis, passa a ser mera questão de tempo.

Nas paisagens de nossos sonhos, nas visões proféticas, a estrutura mandálica está sempre presente.


Jung elegeu a mandala por excelência adequada para simbolizar o psiquismo; isso porque nas representações mitológicas do si mesmo está presente, quase sem exceção, a estrutura quaternária como arcabouço nuclear da alma. Mandalas multiplicam-se pelo mundo. Todos os povos do planeta, de todas as épocas e lugares, expressam-nas em sua arte, bem como nos enredos de seus mitos.

No Oriente, elas são usadas para recompor o ego diante da majestade do eu interior. A contemplação dessas imagens homogêneas, organizadas em torno de um centro, tende a facilitar, por analogia, a emergência de processos inconscientes, capazes de permear de paz interior a mente que deseja vislumbrar a ordem subjacente no cosmos, ou que queira abstrair da contemplação algum significado para a existência ou para o milagre da vida.

Nas paisagens de nossos sonhos, nas visões proféticas, nos contos de fadas, a estrutura mandálica está sempre presente. Há exemplos por toda a parte. Nossa Via Láctea, galáxia espiralada com dois braços que se evolvem a partir de um núcleo, é uma assombrosa mandala. O Sistema Solar é núcleo da mandala que o circunda de planetas; do mesmo modo, elétrons viajam a 960 km/s “presos” a uma esfera mandálica atômica imaginária. Nossos olhos, globos mandálicos, enxergam o mundo por uma lente mandálica cristalina ovalada, coberta pela colorida e radiada mandala da íris. A Terra, aparentemente esférica, é mandala que orbita. O cérebro, composto por dois hemisférios mandálicos, com partes anterior e posterior, mantém o padrão. O mesmo podemos dizer do coração humano, palácio da alma descrito em quatro câmaras. Os pássaros costumam fazer ninhos circulares, e as aranhas tecem mandalas de extraordinário requinte nos cantos das cavernas.

Mandalas fazem isto: propiciam iluminação àquelas mentes
que diante delas silenciam.


Mandalas estão abundantemente representadas no Ocidente principalmente desde a Idade Média. As rosáceas dos vitrais das catedrais de Chartres e Notre-Dame são mandalas translúcidas, inspiradoras da paz interior que deve estar presente nos campos religiosos da mente. Aliás, todas as cruzes, religiosas ou não, incluindo a suástica, são mandalas; a estrela de Davi com seis pontas idem, reforçando o mistério do cruzamento divino e humano pelo entrelaçado de seus dois triângulos equiláteros. Os tabuleiros dos milenares jogos esotéricos (xadrez, go, damas, gamão, etc.) são espaços mandálicos sobre os quais se reproduz o simulacro da dança da vida. Cartas de baralho são igualmente mandalas. No tarô, ela acha-se delineada em todos os arcanos, ressaltada nos maiores, principalmente no Mago, na Justiça, na Roda da Vida, no Enforcado, na Temperança, na Estrela (onde pela primeira vez surgem juntos os quatro elementos), no Julgamento e no Mundo. Na abóbada celeste, projetamos a mandala zodiacal. Nos mitos, as mandalas do destino humano. Um deles, o de Hermes, conta-nos que em torno de seu caduceu estão duas serpentes abraçadas, uma com a função de acompanhar as almas em sua viagem ao reino de Hades, mundo dos mortos; a outra com função psicagógica, a de reconduzir as almas mortas à luz da vida, quando devem renascer. Mandalas fazem isto: propiciam iluminação às mentes que diante delas silenciam e, a partir da pacificação dos indivíduos comuns, proporcionam paz ao mundo, tão carente dessa dádiva.

“Tão certo quanto o amigo ama o amigo,

Também te amo, vida-enigma.

Mesmo que em ti tenha exultado ou chorado,

Mesmo que me tenhas dado prazer ou dor.

Eu te amo junto com teus pesares,

E mesmo que me devas destruir,

Desprender-me-ei de teus braços

Como o amigo se desprende do peito amigo.

Com toda força te abraço!

Deixa tuas chamas me inflamarem,

Deixa-me ainda no ardor da luta

Sondar mais fundo teu enigma.

Ser! Pensar milênios!

Fecha-me em teus braços:

Se já não tens felicidade a me dar -

Vamos, ainda tens tua dor.”
(Lou A.-Salomé 1880à F. Nietzsche para ser musicado por ele)

Se alguém perguntar quem sou, diga que sou a poetisa;
que fala de amor, que fala do vento e se esquece do tempo...
Se alguém perguntar onde vivo, diga que vivo no coração
daqueles que conhecem o amor...
Se alguém perguntar por onde eu ando, diga que ando
pela Noite e que nela me aqueço...
Se alguém perguntar onde estou, diga que estou na poesia,
em cada palavra, na lágrima e também no sorriso.
Se alguém perguntar se eu amo, diga que sou a mulher
mais apaixonado do mundo!...
Se alguém perguntar onde está a minha voz, diga que
minha voz grita em nome daqueles que não são ouvidos...
Se alguém perguntar meu nome, diga para me chamar
de “poesia”... e se alguém perguntar quem eu sou, diga
que sou apenas alguém que ama a vida!...
(Solange Di Santoro)

Bocas


Bocas que falam,
Bocas que sorriem,
Que mordem,
E faz sangrar.
Bocas que seduzem
Que solvem e absorvem
O néctar do amor...

Bocas que sussuram
Palavras desconexas,
Quando em outra boca,
Faz demorada pousada

Bocas ousadas,
Que caminham pelo corpo
Sem pressa de chegar.
Bocas que causam arrepios...

Bocas...
Que se unem,
Bocas que amam,
E que se perdem
Em outras bocas
No extâse alucinante
De uma noite de amor.
(Cida Borges)

Rosas



Rosas que já vos fostes, desfolhadas
Por mãos também que Já foram, rosas
Suaves e tristes! Rosas que as amadas,
Mortas também, beijaram suspirosas...
Umas rubras e vãs, outras fanadas,
Mas cheias do calor das amorosas...
Sois aroma de almofadas silenciosas,
Onde dormiram tranças destrançadas.

Umas brancas, da cor das pobres freiras,
Outras cheias de viço de frescura,
Rosas primeiras, rosas derradeiras!
Ai! Quem melhor que vós, se a dor perdura,
Para coroar-me, rosas passageiras,
O sonho que se esvai na desventura?
(Alphonsus de Guimaraens)

Libanesa


Há um reflexo de areias no brilho dos teus olhos
E um sabor de tâmara na frescura de teus lábios.
Têm a elegância da galera fenícia
As linhas do teu corpo moreno
E sombras de cedros libaneses
As ondas escuras do teu cabelo.
Há uma nostalgia de velhas cidades
E tempos remotos
Na tua tristeza inconsciente.
(Helena Kolody)

Saudade


Trancar o dedo numa porta dói.
Bater com o queixo no chão dói.
Torcer o tornozelo dói.
Um tapa, um soco, um pontapé, doem.
Dói bater a cabeça na quina da mesa,
Dói morder a língua, dói cólica,
cárie e pedra no rim.
Mas o que mais dói é a saudade.

Saudade de um irmão que mora longe.
Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta
que não se encontra mais.
Saudade do pai que morreu,
do amigo imaginário que nunca existiu.
Saudade de uma cidade.
Saudade da gente mesmo,
que o tempo não perdoa.
Doem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida
é a saudade de quem se ama.
(Martha Medeiros)

Ando muito completo de vazios.
Meu órgão de morrer me predomina.
Estou sem eternidades.
Não posso mais saber quando amanheço ontem.
Está rengo de mim o amanhecer.
Ouço o tamanho oblíquo de uma folha.
Atrás do ocaso fervem os insetos.
Enfiei o que pude dentro de um grilo o meu destino.
Essas coisas me mudam para cisco.
A minha independência tem algemas.
(Manoel de Barros)

"Pois logo a mim, tão cheia de garras e sonhos, coubera arrancar de seu coração a flecha farpada. De chofre explicava-se para que eu nascera com mão dura, e para que eu nascera sem nojo da dor. Para que te servem essas unhas longas? Para te arranhar de morte e para arrancar os teus espinhos mortais, responde o lobo do homem. Para que te serve essa cruel boca de fome? Para te morder e para soprar a fim de que eu não te doa demais, meu amor, já que tenho que te doer, eu sou o lobo inevitável pois a vida me foi dada. Para que te servem essas mãos que ardem e prendem? Para ficarmos de mãos dadas, pois preciso tanto, tanto, tanto - uivaram os lobos e olharam intimidados as próprias garras antes de se aconchegarem um no outro para amar e dormir."
(Trecho do conto 'Os desastres de Sofia', in "Felicidade Clandestina)


"Tudo o que se ensina a uma criança, a criança não pode mais, ela mesma, descobrir ou inventar."
(Jean Piaget)

Sem você...


Mil versos cantarei, se preciso for,
Aos quatro cantos, teu nome gritarei,
És a razão da minha vida, meu amor,
Sem ti é um vazio, não mais viverei,

Tudo perde a graça, nem a luz do luar,
A luz, o escuro se torna, cego estou,
És o fulgor, minha vida encantar,
Oh! Amada minha, volte, por favor.

Choro sempre tua falta, noite e dia,
Lagrimas já não tenho, para enxugar,
Penso em você ao meu lado, que bom seria,

Reviver o tempo; beija-la e amar,
Sentir teu corpo ardente, até faria,
Loucuras de amor em qualquer lugar.
(Poeta Mineiro)

Então me vens e me chegas e me invades e me tomas e me pedes e me perdes e te derramas sobre mim com teus olhos sempre fugitivos e abres a boca para libertar novas histórias e outra vez me completo assim, sem urgências, e me concentro inteira nas coisas que me contas, e assim calada, e assim submissa, te mastigo dentro de mim enquanto me apunhalas com lenta delicadeza deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida, que nada devo esperar além dessa máscara colorida, que me queres assim porque é assim que és..."
(Adaptado de 'À beira do mar aberto' de Caio Fernando Abreu)

Um preço acima dos rubis


Toda liberdade tem um preço.
Às vezes, alto demais
para que possamos alcançá-la.
Aquele que quiser ser livre
Tem que ser muito forte,
tem que colocar
seu anseio de liberdade
acima até de si próprio.

Ser livre não é
correr atrás de um sonho,
mas sim realizá-lo.
Ser livre não é
ficar olhando a vida passar,
mas sim correr junto dela.
Ser livre é
enfrentar cada desafio de prisão
e fugir deles.
Ser livre é
olhar para seu interior e dizer:
Eu consegui, eu cheguei lá.

Mesmo que ao dizer isso
tenha lágrimas escorrendo pela face.
Lágrimas que traduzem a alegria de ser livre,
ao mesmo tempo que nos lembram o preço
que pagamos pela liberdade conquistada.

Ser livre, um caminho sofrido,
cuja recompensa encontramos em seu final.
Quando conquistamos, com nosso esforço,
o direito de exercer a nossa liberdade de nosso modo,
e não mais percorrendo o caminho traçado por outros.

Ser livre é um direito de opção que nos pertence.
Não podemos deixar escapar de nossas mãos
a chance de SER LIVRE...
(Suzana Motta)

Tempo que nem sentimos
e tudo passa tão rápido
que quando acordamos
vemos a vida de um
outro colorido.
Tantas lágrimas rolaram,
tantos sorrisos iluminaram
nosso viver.
Hoje... o tempo se esvai lento
e uma tristeza solitária
nos acompanha dia a dia
que perdemos o jeito
de caminhar e até de amar
(Zelisa Camargo)

Boa tarde!


Amar é sofrer "Mas não interessa o negócio é amar"


Tem gente que ama que vive brigando,
E depois que briga acaba voltando.
Tem gente que canta porque está amando,
Quem não tem amor leva a vida esperando,
Uns andam para a frente e nunca se esquecem,
Mas são tão pouquinhos que nem aparecem.
Tem uns que são fracos e dão pra beber,
Outros fazem samba e adoram sofrer.
Tem apaixonado que faz serenata,
Tem amor de raça e amor vira-lata.
Amor com champagne amor com cachaça,
Amor nos iates nos bancos de praça.
Tem homem que briga pela bem amada,
Tem mulher maluca que adora pancada.
Tem quem ama tanto que até enlouquece,
Tem quem dê a vida por quem não merece.
Amores à vista, amores a prazo,
Amor ciumento que só cria caso.
Tem gente que jura sabendo que não é capaz.
Tem gente que escreve até poesia
E rima saudade com hipocrisia.
Tem assunto à beça para a gente falar,
Mas não interessa o negócio é amar.
(Dolores Duran, 1959)

Dindi


Céu, tão grande é o céu
E bandos de nuvens que passam ligeiras
Prá onde elas vão, ah, eu não sei, não sei
E o vento que fala das folhas
Contando as histórias que são de ninguém
Mas que são minhas e de você também
Ai, Dindí
Se soubesses o bem que eu te quero
O mundo seria, Dindí, tudo, Dindí, lindo, Dindí
Ai, Dindí
Se um dia você for embora me leva contigo, Dindí
Olha, Dindí, fica, Dindí
E as águas desse rio
Onde vão, eu não sei
A minha vida inteira, esperei, esperei por você, Dindí
Que é a coisa mais linda que existe
É você não existe, Dindí
(Antonio Carlos Jobim, Aloysio de Oliveira, Ray Gilbert)

''Histórias de amor são como borboletas:
você consegue ver, pode até tocar,
mas se você tentar guardar uma para você
ela simplesmente morre.
Tem que saber admirar de longe.''
(Nuno Boggiss)

Tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente! Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas, como um corpo ressequido que se estira num banho tépido; sentia um acréscimo de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo conduzia a um êxtase, e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações!
(Eça de Queiroz)

Inocência...

Estilo de vida


"Eu
não coleciono fracassos
para chorar à noite,
na sombra da amargura,
nem quero morrer de tédio,
por erros e acusações.
Prefiro ir.
Escolhi
a verdade, mesmo com açoite,
a infinita ternura,
o abraço dado,
sem qualquer censura,
a ventura de fluir.
Quero
seguir em frente,
sem olhar pra trás,
decidir com fé,
e concluir,
todo o meu projeto de vida,
de cabeça erguida,
de pé."
(Ivone Boechat)

Tuas Mãos


Com ternura e paixão,

Sempre acordam a emoção!

Em chamas abalam o coração

Como um vulcão em erosão!
(Maria Thereza Neves)

Dorme sob o silêncio o parque. Com descanso,
Aos haustos, aspirando o finíssimo extrato
Que evapora a verdura e que deleita o olfato,
Pelas alas sem fim das árvores avanço.

Francisca Júlia {poetisa parnasiana}

Falando de Amor


Se eu pudesse por um dia
Esse amor, essa alegria
Eu te juro, te daria
Se pudesse esse amor todo dia
Chega perto, vem sem medo
Chega mais meu coração
Vem ouvir esse segredo
Escondido num choro canção
Se soubesses como eu gosto
Do teu cheiro, teu jeito de flor
Não negavas um beijinho
A quem anda perdido de amor
Chora flauta, chora pinho
Choro eu o teu cantor
Chora manso, bem baixinho
Nesse choro falando de amor

Quando passas, tão bonita
Nessa rua banhada de sol
Minha alma segue aflita
E eu me esqueço até do futebol
Vem depressa, vem sem medo
Foi pra ti meu coração
Que eu guardei esse segredo
Escondido num choro canção
Lá no fundo do meu coração
(Tom Jobim)

Catavento


Do oriente, os ventos quentes e mágicos
Do ocidente, os zéfiros frescos e suaves
Do sul, o vento que esfria
Do norte, o que sustenta.

Forças misteriosas
Que passam horizontais/verticais
Com alento próprio
Transformando a natureza
Em nuvens
Em dunas
Num vai-e-vem infinito
Enfunando o catavento
Em redemoinhos loucos
Provocando
O sorriso do menino.
(Cármen Rocha)

À minha amada...


Quem é a mulher que escala a montanha
Como uma coluna de fumo, densa
De um aroma de areia destilada
Em cadins de esmeraldas.
Minha e cativa minha
Em ti não ouço as falhas das chuvas
És somente mulher, nada há em ti de homem.
Elevastes o meu coração, pássaro meu
Com um dos adereços do teu cabelo
Como é bonito o teu amor, minha irmã, parte minha
É ainda melhor o teu amor
Do que a vida que se tem tudo.
O cheiro do teu vestido vem dos buracos das matas.
Jardim repleto és tu, minha irmã.
Guardas nos teus seios o cristalino e o narciso
O alecrim e a flor de Deus.
Não revelas os segredos dos jardins, minha namorada
(Naeno)

Só quero voltar a acordar
quando meus sentidos te tocarem
onde meus desejos não serão sonhos
e o meu amor achar tua morada.

Curtam o carnaval da maneira que lhes convém,mas SEMPRE com respeito a natureza,aos animais e ao semelhante!

Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio... Que as palavras que falo não sejam ouvidas como prece... nem repetidas com fervor... apenas respeitadas como a única coisa que resta a uma mulher inundada de sentimento... porque metade de mim é o que ouço mas a outra metade é o que calo... E que a minha loucura seja perdoada... porque metade de mim é amor e a outra metade também.
(Oswaldo Montenegro)